terça-feira, 30 de junho de 2009

Mulato bamba

Noel Rosa

Esse mulato forte é do Salgueiro

Passear no tintureiro era seu esporte

Já nasceu com sorte

E desde pirralho vive à custa do baralho

Nunca viu trabalho

E quando tira samba é novidade

Quer no morrro ou na cidade, ele sempre foi o

Bamba

As morenas do lugar vivem a se lamentar

Por saber que ele não quer

Se apaixonar por mulher

O mulato é de fato

E sabe fazer frente a qualquer valente

Mas não quer saber de fita

Nem com mulher bonita

Sei que ele anda agora aborrecido

Porque vive perseguido sempre a toda hora

Ele vai-se embora

Pra se livrar do feitiço e do azar

Das morenas de lá

Eu sei que o morro inteiro vai sentir

Quando o mulato parir dando adeus para o

Salgueiro

As morenas vão chorar, vão pedir pra ele voltar

Ele então diz com desdém

“Quem tudo quer, nada tem!”

SOBRE O SURGIMENTO DO CHORO

O surgimento do choro no Brasil data do sáculo XIX, quando foi importada da Europa, pela classe média, a polca. No Rio de Janeiro, a partir de 1980, músicos populares já adicionaram ao som um tom lamentoso (daí o nome de choro). Segundo Dias, a transnacionalidade do choro dá-se através da hibridez dos gêneros musicais e a transnacionalização tem a ver com a semelhança com a música barroca.

A princípio, o choro apresentou influências marcantes de danças européias, como a polca, a valsa, scottisches. A adaptação desses sons, no que tange não só à improvização e virtuosidade dos músicos, mas também à implementação de inflexões e modulações melancólicas, é que começou a definir o gênero. Porém o ritmo, também marcado por uma intensa movimentação do baixo, não foi criado para dançar. O choro deve ser cantado nas chamadas “rodas de choro” ou em apresentações excepcionais, por exceção, como bem fazia a cantora potiguar Ademilde Fonseca, considerada por mais de vinte anos como a “rainha do choro”.

Entretanto nos seus primórdios, ainda na forma de maxixe, as danças executadas no Palácio do Catete (moradia do presidente da república na época), no início do século XX, costumavam escandalizar os expectadores mais pudorosos. Em 1914, o senador Ruy Barbosa escreveu ao presidente a respeito do “Corta-jaca” (alcunha do maxixe “Gaúcho”, da compositora e maestrina Chiquinha Gonzaga):

Uma das folhas de ontem estampou em fac-símile o programa da

recepção presidencial em que, diante do corpo diplomático, da

mais fina sociedade do Rio de Janeiro, aqueles que deviam dar ao

país o exemplo das boas maneiras mais distintas e dos costumes

mais reservados elevaram o corta-jaca à altura de uma instituição

social. Mas o corta-jaca de que eu ouvira falar há muito tempo, que

vem a ser ele, Sr. Presidente? A mais baixa, a mais chula, a mais

grosseira de todas as danças selvagens, a irmã gêmea do batuque, do

cateretê e do samba. Mas nas recepções presidenciais o corta-jaca

é executado com todas as honras de Wagner, e não se quer que a

consciência desse país se revolte, que as nossas faces se enrubesçam

e que a mocidade se ria!

Nos séculos XIX e XX, sob fortes influências do músico Pixinguinha, o choro consagrou-se como um dos principais gêneros musicais brasileiros, sendo muito tocado nas grandes capitais como São Paulo e Rio de Janeiro. Inicialmente o chorinho conservou seu caráter popular, porém com o passar do tempo ganhou ares de erudição e influenciou na produção de compositores brasileiros eruditos como Heitor Villa-Lobos, Francisco Mignone, Radamés Gnatalli, entre outros. Tudo isso sem abandonar sua raiz popular brasileira, tornando-se a matriz harmônica e formal de nossa música instrumental.

Até a década de 1920 o choro era caracterizado por ser uma forma de tocar, não como um estilo musical, como é considerado atualmente.

Assim como no samba, no sertanejo de raiz e em outros estilos musicais bastante difundidos no brasil, o choro tem seus personagens e heróis. O compositor considerado o “rei dos chorões” Joaquim Antônio da Silva Callado, autor de quase 70 melodias, é elogiado por Diniz (2003, p. 15):

Mestiço simpático, exímio flautista, mulherengo, e muito popular

na cidade do Rio de Janeiro, Joaquim Callado era “filho da primeira

geração do choro”. Ao seu lado estavam Viriato Figueira, também

flautista e saxofonista, Virgilio Pinto, compositor e instrumentista,

e o flautista Saturnino, entre outros músicos que ajudam a criação

do choro.

Entre os sucessos de Callado encontramos “A flor amorosa”, reconhecida como a primeira canção do choro. Assim o ano de 1977, através desta música composta a partir de um lundu e que ficou conhecida como uma dos clássicos do gênero, marcou defitivamente a história como data simbólica de nascimento do choro.

Entre outras personalidades do chorinho é importante citar Pixinguinha, Jacob do Bandolim, Waldir Azevedo, Chiquinha Gonzaga, Ernesto Nazareth, Ary Barroso, Heitor Villa-Lobos e Radamés Gnatalli. Falar sobre a obra e influência de cada um exigiria muito mais que um blog. A importância destes músicos na formação do cenário musical da cultura brasileira chega a fugir do léxico.

Deve ser o meu amor

Ary Barroso

Ouço a batida de um tambor

No compasso do pandeiro

Deve ser o meu amor

Batucando no terrreiro

Meu amor quando samba

Ninguém dá opinião

Tem diploma de bamba

Põe os pés no coração

Meu Deus do céu

Ele é meu de mais ninguém

E eu dele também

E assim o nosso amor não tem fim

UM POUCO SOBRE O RIO DE JANEIRO NO SÉC. XX

Durante a primeira república brasileira, no auge de grandes mudanças culturais que o Brasil atravessava, houve uma participação expressiva de negros e mulatos,não apenas como consumidores e/ou expectadores, mas também como produtores e divulgadores dessa nova cara que o país mostrava ao mundo. Eles vinham de camadas intermediárias da população carioca, massacrados pelas elites e classes médias brancas por um lado, e por outro pela enorme quantidade de ex-escravos e migrantes, que dirigiam-se às grandes cidades em busca de melhores condições de vida. Essa cultura produzida por negros e mulatos, sobretudo a música, ultrapassava os espaços privados e chegava até as salas das “casas de família”,onde antes a presença negra limitava-se à cozinha.

Entre os novos espaços da música popular podemos destacar a nascente indústria fonográfica que produziu, em 1902, os primeiros cilindros e chapas comerciais do país. Inicialmente de alto custo, logo tornaram-se acessíveis a boa parte da população carioca, já que nessa primeira fase os fonógrafos podiam ser escutados através de um sistema semelhante ao da juke-box, acionados por uma moeda. Esses mecanismos eram dispostos em lugares de ajuntamento público.

As músicas gravadas também se popularizavam ao serem reproduzidas nas ruas, tocadas em bares, teatros, além de lojas especializadas na venda de produtos musicais, que nessa época exerciam influência relevante no comércio e consumo dessas formas simbólicas de transmissão cultural.

Em equivalência ao piano nos espaços domésticos, as bandas militares ocupavam as ruas. Essas agremiações foram responsáveis, no Brasil, assim como em outros países, pela distribuição massiva de novas facetas culturais advindas das camadas populares. Além de divulgar gêneros poucos difundidos a um grande número de pessoas (maxixe, polca, etc) essas bandas (nem sempre militares) eram também escola de formação a diversos músicos oriundos das camadas sociais mais pobres. Numa dessas escolas de formação do Rio de Janeiro, Pixinguinha era professor de música e diretor de banda.

PIXINGUINHA

Alfredo Vianna da Rocha Filho nasceu no dia 23 de abril de 1987, filho de Raimunda Maria da Conceição e Alfredo Vianna da Rocha, no Rio de Janeiro. Pixinguinha pertencia à baixa classe média carioca e seu pai era flautista amador, contribuindo posteriormente à divulgação do choro com seu grupo também amador.

Quando criança aprendeu a tocar cavaquinho, flauta e aos 11 anos já acompanhava seu pai nas rodas das festas de família. As rodas de choro, conhecidas como pau-e-corda, em alusão aos instrumentos que a compunham (flauta, violão e cavaquinho)foram grandes responsáveis pelas rodas de dança no Rio.

A entrada no mercado não tardou a ocorrer. Aos 14 anos Pixinguinha já atuava nas casas de chope da Lapa e em cabarés. Uma curiosidade é que nesses ambientes a música não servia mais apenas para a dança e as pessoas a apreciavam por puro deleite estético, até então privilégio das músicas de concerto.

Muitos autores apontam que Pixinguinha conseguiu fazer uma ponte entre o erudito e o popular, mas cabe defender que ele não dominava a linguagem erudita, nem tampouco aspirava à glória. O que o diferencia dos demais é tão somente sua escuta singular, ampla, que incorporava intuitivamente diversas tradições.

Embora vários artistas tenham se destacado no choro, foi Pixinguinha e sua geração, que com sua nova linguagem, sintetizando a “música para dançar” com a “música para escutar”, conseguiu fundir diversos elementos que se encontavam dispersos nas gerações anteriores.

UMA ANÁLISE SOBRE A CULTURA

Sobretudo no começo do século XX o Brasil passava por um processo de descoberta de uma identidade nacional. O povo precisava de algo que os diferenciasse dos europeus ou de outros povos que influenciaram a formação etinica brasileira (com migrações, etc.). Algo autenticamente nosso e que nos unisse como nação.

A princípio o interesse pelo popular encontrou barreiras construídas pelo preconceito e por falsas teorias sobre a miscigenação (nossa principal diferenciação), que a julgam o mal responsável por um suposto “atraso cultural” e degeneração racial.

Algumas décadas mais tarde veríamos essa busca por uma identidade itensificadas por uma manifestação e interesse generalizados por manifestações culturais negras e mestiças, em especial a música. O negro e o mestiço que antes eram um problema, passam a ser a solução, como um elo de ligação para a sustentação da sociedade.

Nesse quadro,vemos surgir o choro, no início ainda bem carregado com elementos europeus, mas que aos poucos, com o empenho de fabulosos artistas e a aceitação do público como música popular (não popularesca) ganha espaço no que hoje já se convencionou chamar de música tipicamente brasileira.

Juntamente com o samba e a música de raiz, o chorinho integra essa seleção musical que pretende construir o imaginário cultural brasileiro. Longe dessa classificação simplista, seguimos tecendo, apanhando os elementos do nosso passado, juntando aos do presente, para formar essa complexa tessitura que chamamos cultura brasileira.

segunda-feira, 29 de junho de 2009

Chorinho em Goiás


O Clube do Choro foi constituído oficialmente em 1984 e teve seu auge quando funcionava o Estúdio Center de música no setor universitário, na época de propriedade do prof. Oscar Wilson, que por ser um grande admirador do estilo colocava seus alunos para aprender e apresentar nas reuniões que aconteciam no fundo da escola. Com o fechamento do estúdio o clube ficou sem um local para apresentação, ficando quase esquecido pelo público. Por falta de apoio financeiro, o projeto do clube foi paralizado e retornou apenas em 2004 com apoio do Instituto do patrimônio histórico e artístico nacional - IPHAN.

Uma das maiores referências ao Chorinho em Goiânia foi o Projeto Grande hotel revive o choro, da Secretaria Municipal de Cultura, que era realizado às sextas feiras na calçada do Grande Hotel, localizado na esquina da Av. Goiás com a rua 3, Centro. No fim de 2008, com a nova gestão do hotel, as apresentações que já não se resumiam apenas há grupos de choro, deixaram de que acontecer e o Grande Hotel acabou tendo as portas fechadas por determinação da justiça.

Recentemente, o projeto foi retomado e os encontros estão sendo realizadas no Clube de Engenharia de Goiás.